Mortes em favelas caem com menos operações durante pandemia, diz estudo do Observatório de Segurança

Foto: Renato Moura/Voz das Comunidades
Operação no Alemão. Foto: Renato Moura / Voz das Comunidades

O Observatório de Segurança Pública do Rio de Janeiro divulgou, nesta terça-feira (7/4), um estudo dos primeiros efeitos das operações policiais em meio a pandemia do Coronavírus. A pesquisa comparou o número de operações e patrulhamentos, forças utilizadas e vítimas decorrentes destas operações no mês de março deste ano com o mesmo período em 2019.

Depois do decreto do dia 16 de março, que declarou Estado de Emergência no Rio de Janeiro, foi registrada uma diminuição de 23% do número de operações, o que resultou em uma queda de vítimas fatais durantes as ações. Em março deste ano foram 15 operações contra 36 do mesmo mês em 2019.

De acordo com a pesquisa, conforme o combate à pandemia foi aumentando, o número de operações policiais caiu, visto que a polícia voltou às atividades ao controle de trens e metrôs, checagem de denúncias de venda de álcool em gel, entre outros. Nos primeiros 15 dias de março, houve 58 operações e 81 ações de patrulhamento. Desde o decreto de situação de emergência (16/03) até o dia 31 do mesmo mês, o número de operações reduziu 74% e os patrulhamentos, 49%. 

Teste 3

A participação da Polícia Militar em ações diminuiu em 30%, na comparação com o mesmo período do ano passado. Para Bruna Sotero, pesquisadora do Observatório, a principal característica da Militar é a ostensividade enquanto que a Civil tem como principal atribuição o papel investigativo. No período analisado, a Polícia Civil teve aumento de 116% em atividades.

O perfil das ações policiais também foi alterado. Enquanto em março de 2019 o trabalho estava mais voltado para a repressão do tráfico, neste ano as operações de patrimônio – como roubo de cargas e dano à propriedade alheia, fuga/prisão, festas e manifestações culturais nas periferias, entre outras motivações – tiveram maior destaque. 

O estudo também aponta maior participação da Guarda Municipal nos patrulhamentos. Para Bruna Sotero, “a mudança no artigo 144 trouxe para hoje as denominadas Guardas Civis, à vinculação desta ao campo da Segurança Pública deixando de ser exclusivamente patrimonial e lhe conferindo poder de polícia”, analisa.

Operações em meio à pandemia

As operações nas favelas e periferias são um desafio à sanidade mental dos moradores e policiais envolvidos, assim como interfere no calendário escolar e no ir e vir das pessoas. Com a pandemia do Coronavírus, esses territórios que já enfrentam problemas, como falta de estrutura sanitária e casas muito próximas uma das outras, podem somar a essas preocupações a insegurança se as operações frequentes retornarem.

O coletivo de mídia comunitária Maré Vive, do Complexo da Maré, publicou em redes sociais algumas das consequências da operação realizada no dia 06/4. Duas Clínicas da Família foram fechadas, uma ação de distribuição de cestas básicas e produtos de higiene foi suspensa. Além disso, o terror psicológico trazido pelas operações tenciona ainda mais a realidade de pandemia. 

Para a produtora e videomaker Suzane Santos, moradora da favela Parque União, no Complexo da Maré, as operações atrapalham a logística de entrega de cestas básicas e quentinhas, distribuídas por mobilizadores sociais na Maré, e, além disso, apontam para o descuido do poder público. “Quando a única política pública que chega no nosso território em meio à pandemia é uma operação policial, sem o menor cuidado com a transmissão do vírus, fica entendido o quanto não se importam com a vida e a saúde das pessoas que aqui habitam”, ressalta Suzane.

Bruna Sotero alerta que é preciso entender se a queda das operações podem indicar um possível padrão ou tiveram ligação direta com a pandemia. A respeito dos recentes confrontos ocorridos na primeira semana de abril no Complexo do Alemão e na Maré, Acari, Vila Aliança e Cidade de Deus, a pesquisadora pondera: “ainda tá muito cedo para fazermos análises sobre o contexto e motivações das operações, mas continuamos atentos sobre o aumento e continuamos monitorando os casos.”

O Voz das Comunidades pediu esclarecimentos às polícias Militar e Civil do Rio de Janeiro sobre a queda de letalidades e os recentes confrontos, e até o momento da publicação desta reportagem não teve retorno.

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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