Profissionais que contribuem com a comunidade levando os passageiros aos seus destinos
O Rio de Janeiro é a cidade com maior número de habitantes em favelas do Brasil. As comunidades sempre tiveram a sua identidade e o espaço é valorizado pelos moradores e repleto de gente criativa. É natural que o ser humano crie novas maneiras de sobrevivência. O curioso é verificar que em ruas, becos e vielas tão estreitos trafegam carros, kombis, motos. Isso prova o quanto o morador de favela é capaz de criar o seu roteiro, independente de qualquer situação.
O Complexo do Alemão em especial é um dos conjuntos de favelas onde há mais pontos de mototaxistas dentro e no entorno da comunidade. Cada mototaxista trabalha em ritmos e horários diferentes, fazendo com que o mototáxi funcione 24h. Luciano Souza, um dos mais antigos do ponto de Bonsucesso, fala sobre a sua vida nessa profissão. Ele conta que seu dia a dia é muito diferente dos demais, trabalhando cerca de nove horas por dia e de segunda a Sábado.
Muitos deles têm um segundo emprego para reforçar a renda familiar e poucos estão ali por divertimento. No caso de Luciano, porém, a profissão de mototáxi é única e exclusiva, pois é com esse serviço que ele mantém a sua família. Ele diz que trabalhar transportando apenas os moradores para dentro da comunidade não é vantagem, por isso, tem alguns contatos profissionais que o chamam para serviços em outros lugares.
Fora da comunidade
Teste 3
Para ter uma noção do quanto essa profissão é importante, boa grande parte deles já realizaram viagens para diversas regiões como Manguaratiba, Cabo Frio, Petrópolis, Nova Iguaçu, entre outros lugares. Aos 56 anos, Selma Crispino diz não perder tempo com ônibus, táxi, ou qualquer outra condução. Dona do seu próprio negócio na Nova Brasília, ela roda o estado do Rio de Janeiro inteiro de mototáxi para fazer entregas. No seu caso, um dos lugares mais distantes foi o município de Campos.
A organização de viagens entre eles são todas anotadas para que não haja desfavorecimento de alguns e privilégio de outros, mas nada impede que um passageiro chegue e peça para ir com outra moto. Isso é tudo combinado junto deles.
Tarifa
Alguns se perguntam como são feitas as alterações de preço. Essa questão depende muito de cada ponto de mototáxi. Trabalhando há nove anos no mesmo ponto, Luciano diz que a mudança de tarifa sempre foi de acordo com a modificação das passagens dos transportes públicos. Eles usam também o bom senso, cobrando um valor adequado ao passageiro que quer ir para a sua residência ou para um local mais próximo, tanto é que o menor preço é de três reais.
Preconceito
Um diferencial dos motoqueiros de Bonsucesso é não utilizar o colete de mototaxista, ao contrário de outros pontos, porque o preconceito é grande. Eles estão sempre realizando viagens para diversos bairros e cidades do RJ, e nessas rotas diferenciadas a discriminação prevalece. Quando se usa o colete para sair da comunidade, eles sofrem na pele o olhar desigual da sociedade ou até mesmo numa blitz policial.
“Na visão da sociedade, o mototáxi é o cara que carrega vagabundo, é o cara que carrega drogas, é o cara que faz bonde, mas isso não tem nada a ver. Em todas as profissões tem o corrupto, seja na polícia, na política ou até mesmo aqui. Tem o cara que trabalha errado, mas também tem o bom profissional”, diz Luciano.
Insegurança
Muitos deles preferem transportar um passageiro para fora da comunidade em razão da insegurança, pois nunca se sabe o que pode acontecer na ida ou na volta quando se leva alguém para dentro da favela. Os incidentes mais relatados por eles são o de levar o morador na comunidade e na volta ter troca de tiros e ter de mudar o percurso e o de ser abordado de maneira inadequada por policiais, entre outros. São diversos os fatores que levam esses rapazes a estar nessa profissão e a maioria está ali porque necessita de uma renda, pois tem família para sustentar.
A insegurança também é sentida por alguns passageiros. “Eu detesto moto. Ando a pé, mas não subo nela. Tenho muito medo. Ela não te oferece segurança alguma, quando eu vejo alguns rapazes em alta velocidade, fico apavorada. Não tenho nada contra a profissão, é uma coisa minha mesmo”, diz Sandi Silva, de 23 anos.
Regulamentação
Em julho de 2009, o senado aprovou uma lei que permite exercer livremente a profissão de mototaxista dentro de alguns parâmetros estabelecidos, porém, a autorização depende dos governantes de cada cidade.
Na cidade de São Paulo, o sindicato dos motoboys é contra. Numa entrevista ao site Estadão Brasil, o representante da categoria, Gilberto dos Santos, diz que a regulamentação na cidade seria “uma carnificina”. “Se a gente (motoboy) já sofre, imagina dobrando o número de motos, com o mototáxi. Só ia dar dor de cabeça.”
Entretanto, em Brasília, clandestinidade não existe mais. Em fevereiro de 2014 foi concedido o direito dos mototaxistas de circularem livremente pela capital, de acordo com a regulamentação. A liberação dessa profissão gera grandes benefícios para todas as partes.
O fato de ser legalizado ou não gira em torno de muitas consequências negativas relacionadas à moto como meio de transporte, pois não oferece muitas opções de segurança.
Paixão pelo que faz
Na visão de muitas mães, a moto é um atentado contra a vida, justamente pela falta de proteção. Ainda assim, de forma geral, é nítido o quanto esse meio de transporte é favorável em qualquer tipo de situação, seja no trânsito, seja na eficiência e rapidez. De fato, é um veículo de contradições.
Caio era apaixonado por moto, até que um dia um amigo chamado King lhe ensinou a pilotar. Aos 14 anos, Denise de Morais, mãe de Caio, teve um surto ao saber que o filho tinha aprendido a andar de moto. Após muita insistência, ela cedeu. Anos depois, ele começa a trabalhar como motoboy para a sua mãe e, na sequência, passa a conciliar isso com a vida de mototaxista.
Segundo Alberto Beto, um dos mais antigos do ponto do Joaquim de Queiroz, “para subir numa moto e trabalhar sobre ela, isso tem que estar no sangue”.
Pacificação
Alberto é conhecido como Betinho no ponto da Grota e é imparcial sobre este assunto. Seu maior objetivo é manter a sua renda para sustentar a sua família. Há quatro anos, o ponto da Grota foi reformado pela obra do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) com autorização do prefeito. Sua aparência é similar à do calçadão de Copacabana, um visual diferente dos demais.
Denise diz que o seu filho ficou por seis anos nessa profissão, mas alguns imprevistos aconteciam após a pacificação. Um deles foi um policial proibiu seu filho de circular pelas ruas. Ela foi até o policial e lhe fez a seguinte pergunta: Você prefere ele trabalhando como mototaxista ou jogado no tráfico ? Após o diálogo entre ambos, Caio continuou a trabalhar livremente pelo Complexo.
União
Há trinta e três anos pilotando moto, Betinho ressalta a importância dos cuidados e o respeito que se deve ter sobre este meio de transporte, pois a exposição ao risco é muito Após deixar um passageiro em seu destino dentro do Alemão, na volta houve uma maior, mesmo estando protegido. Em todos esses anos de experiência ele já vivenciou diversos acidentes, justamente pela falta de atenção e cautela. O que ele tenta passar todos os dias aos motoqueiros é a prudência sobre duas rodas.
Durante uma manifestação, Caio foi a ngido por um ro enquanto trabalhava e faleceu. Denise, sua mãe, conta o quanto os motoqueiros são unidos. A prova disso foi quando os grupos de mototaxistas compareceram ao enterro e logo depois fizeram uma extensa passeata na estrada do Itararé sobre as motos.
Desafio
Os grandes desafios são quando se começa a pilotar uma moto e quando se resolve tomar como profissão esse veículo. É muito mais que um es mulo, de fato é um perigo mesmo com toda atenção do necessária. As incertezas desse meio de transporte fazem com que o motoqueiro redobre os cuidados, afinal, a missão desse o cio é transportar vidas, por isso é indispensável a sensatez.