Na gíria do funk, a expressão “vida loka” significa vida bandida. E foi justamente “Vida louca vida” a primeira música que Wallace Ferreira da Mota, o MC Smith, gravou depois que passou uns dias na prisão em dezembro de 2010 por apologia ao crime e associação para o tráfico. Com a versão em funk melody da música de Lobão e Bernardo Vilhena eternizada na voz de Cazuza, nascia o sonho de Smith de gravar um CD com releituras de canções do poeta do rock. O sonho virou o projeto “Brazilian dreams”, que engloba ainda shows com a renda revertida para a Sociedade Viva Cazuza, e foi aprovado por Lucinha Araújo, mãe do cantor.
– Após eu sair da prisão, decidi gravar essa música, que tinha a ver com o momento pelo qual eu estava passando. A ideia era unir o som da classe alta, que é o rock, à batida do funk, que vem da classe baixa. Passamos por uma decadência do movimento, em que o funkeiro não é respeitado por nenhum tipo de mídia. O Cazuza era um cara muito polêmico, que falava o que pensava e revolucionou a música. Me identifico com isso, e minha meta é deixar um legado para a juventude que não conheceu a verdade que ele cantava – diz Smith, de 24 anos.
No repertório que o funkeiro do Complexo do Alemão pretende regravar estão clássicos como “Beth Balanço”, “Maior abandonado”, “O tempo não para”, “Faz parte do meu show”, “Preciso dizer que te amo”, “Brasil”, “O nosso amor a gente inventa”, “Exagerado”, “Ideologia”, “Blues da piedade”, “Codinome beija-flor” e “Pro dia nascer feliz”. Smith ainda quer convidar medalhões da MPB para fazer duetos, como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Sandra de Sá, Simone e Gal Costa, além da participação do Barão Vermelho. Pelo menos com um sim ele já conta, o de Lucinha Araújo.
Teste 3
– Foi uma iniciativa que partiu dele, achei interessante e dou a maior força. As crianças e adolescentes da Viva Cazuza me perguntaram se eu conhecia o MC Smith cantando Cazuza em ritmo de funk. Quando o conheci, fiquei boba e encantada com tudo o que ele sabia sobre o meu filho. Além das letras, já havia lido os livros e visto o filme. De um modo geral, o funk tem letras indigentes, mas pode ser que ele consiga atingir outro tipo de público com essas releituras. Tenho certeza de que o Cazuza apoiaria, pois ele gostava de tudo que era novidade – afirma Lucinha.
Mas o sonho brasileiro de Smith não é apenas musical. Além de uma escola de música, ele quer criar uma ONG que seja responsável por um posto de atendimento para dependentes químicos e portadores de HIV no Complexo do Alemão.
– Hoje, não há ninguém que olhe para essas pessoas na comunidade. Queremos fazer um trabalho em parceria com a Viva Cazuza e permitir que os favelados se formem músicos sem sair de lá.
Revista MEGAZINE – Jornal O Globo – Lauro Neto – 14/10/2011