Ilustração: Marlon Dias / Voz das Comunidades
Durante o processo de estudo para escrever cada texto aqui da coluna, tomo um tempo para refletir sobre as agressões que chegam em nossos corpos (pessoas plurais, LGBTQIA+) de forma imperceptível. Tento fazer um distanciamento como comunicadora, mas são tantas as agressões que confesso às vezes me sentir perdida.
Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu por 7 votos a favor e 4 contra que homens homossexuais agora podem doar sangue, o que para muitos era um sonho, diga-se de passagem, distante. Desde 2016, existia um questionamento de uma portaria que impossibilitava pessoas gays de doarem sangue por fazer parte de um “grupo de risco” ou “comportamento de risco”, tendo em vista que pessoas LGBTQIA+ sempre sofreram com o estigma de seus corpos serem lidos como sexualizados ou de forma promíscua.
Teste 3
Não foram poucas as tentativas de conseguir um relato de alguém que tenha sofrido na pele o que era ter o seu direito negado única e exclusivamente por uma questão de preconceito, tendo em vista que, segundo os dados fornecidos pelo Ministério da Saúde, as pessoas heterossexuais somam a maioria na parcela de notificações de casos de infecções pelo HIV no Brasil. Sobre as tentativas, quase todas frustradas, nota-se ainda um medo muito grande de uma leitura preconceituosa para quem fala sobre isso abertamente. Os medos têm nomes: a homofobia e a transfobia.
Chamarei de João, o jovem de 21 anos e morador da Providência que revela ter como sonho doar sangue, e de Paloma, uma travesti de 32 anos, moradora de Icaraí.
“Sempre que minhas amigas ou amigos doaram sangue e me contaram sobre a experiência, me vinha uma sensação de estar sendo excluído da sociedade por não poder ter esse direito também. Eu sempre fui uma “bixa” afeminada, jamais conseguiria passar por essa triagem que eles (profissionais da saúde) fazem na hora da doação” desabafa João.
Vale ressaltar que a decisão do STF se refere à homens homossexuais, mas esqueceram de se referirem a toda a população LGBTQIA+, mais especificamente mulheres trans e travestis que sofrem ainda mais no momento da tentativa de doar sangue, justamente porque são tratadas como “homens”.
“Posso afirmar que uma das minhas piores experiências de transfobia foi quando tentei doar sangue para a mãe de uma amiga que estava precisando de doação. Eu sempre tive muito cuidado com a minha saúde e tenho exames que comprovam isso, mas na hora que tentei doar além de não respeitarem o meu nome social, também me trataram como um ser “masculino” e disseram que eu não poderia doar porque não tinha como comprovar que eu não tinha tido relação sexual sem preservativo naquela semana.” conta Paloma.
Em uma sociedade em que o patriarcado ainda prevalece, fica explícita a necessidade de estarmos sempre atentos aos direitos de nossos corpos que nos são tirados de forma quase que sempre agressiva. Também fica aberta a possibilidade de discutirmos o que é “direito”, já que no dicionário o significado diz que é “justo”, “correto”, mas não é isso que vivenciamos e percebemos.