Elevatória da Cedae volta a operar com 100% da capacidade, mas moradores do Alemão ainda sofrem com a falta d’água

O problema foi resolvido, mas o descaso continua e moradores de favela passam dias sem água em meio à pandemia

Foto: Vilma Ribeiro / Voz das Comunidades

A maioria das favelas do Rio sofre com a carência de saneamento básico, o que consequentemente influencia na qualidade de vida dos moradores. Um desses problemas é a falta d’água, dura realidade de muitas famílias que vivem nas comunidades. Com o atual cenário de pandemia, essa questão se agrava, pois umas das medidas de prevenção contra o coronavírus é a higienização das mãos com água e sabão. 

Devido a problemas na elevatória da Cedae, 1 milhão de pessoas foram afetadas no estado do Rio pela falta de água. A Elevatória do Lameirão voltou a operar com 100% da capacidade no dia 21 de dezembro, mas o abastecimento não foi normalizado em algumas regiões, e diversas famílias passaram o Natal e a virada de ano com as torneiras secas. 

Teste 3

Um exemplo é o Complexo do Alemão, na Zona Norte do Rio de Janeiro, onde a falta d’água vem afetando brutalmente os moradores nos últimos meses. Localidades como Alvorada, Morro da Baiana, Central, Grota, Relicário, Sabino e Loteamento estão sem água. Em meio ao calor intenso e a pandemia, moradores buscam soluções independentes para driblar a situação, já que as medidas estabelecidas pelas autoridades para reduzir os impactos, como rodízio de abastecimento e disponibilidade de carros pipas, foram ineficazes na favela. 

Moradores vivem meses de descaso

Enquanto o problema não é resolvido pelos órgãos responsáveis, as pessoas contam com a coletividade e solidariedade da vizinhança. No Morro da Baiana, após mais de 20 dias sem água, moradores fizeram uma rede de distribuição e revezam o abastecimento.  

A situação se repete na Central e o amparo surge de quem vive na comunidade. A água de uma nascente cai direto na casa do comunicador social Luciano Daniel, 21 anos, que ao ver a necessidade dos moradores disponibilizou o acesso aos vizinhos. “Disponibilizei a nascente para todos quando começaram a ficar sem água e sem dinheiro para comprar. Os moradores fizeram fila com baldes de água e agradeceram muito. Me senti mais solidário, menos individualista e pude contemplar uma verdadeira união entre os moradores, um olhando o balde para o outro, todos na luta, mas lutando juntos e sem individualismo”, diz Luciano.

Para outros moradores do Complexo do Alemão o jeito é carregar baldes e garrafas d’água de uma bica próximo ao ponto do moto-táxi da Grota. Segundo relatos das pessoas que moram na região, há mais de vinte dias não cai água em algumas residências e o único recurso é a bica da Grota.

O caso também se estende há um mês na Alvorada. Gleyciane Alves, 30 anos, mora na localidade e vem sofrendo com o descaso. Ela conta que durante um tempo precisou usar utensílios descartáveis porque não tinha como lavar as louças, o que gerou muitos gastos, assim como a compra de galões de água. Com uma filha de três anos em casa, Gleyciane expõe as dificuldades: “Eu pego água da chuva para jogar no banheiro e as roupas lavo na casa da minha sogra em Manguinhos. Eu tenho uma filha pequena e não ter água para lavar as mãos em plena pandemia é complicado.”

Depois que passou o Natal sem água, Gleyciane conseguiu encher a caixa, mas desabafa: “Já estou com medo da minha água acabar e eu ter que passar por tudo de novo. É traumatizante o que a gente está vivendo nos últimos meses. Passei o Natal na minha sogra porque o dinheiro da ceia gastamos com água. É um absurdo deixarem esse descaso acontecer, pra mim isso é desumano.”

Denise Souza, de 42 anos, também mora na Alvorada e enfrenta o mesmo problema de Gleyciane Alves, ela espera chover para encher baldes e assim conseguir limpar a casa. De acordo com Denise, este não é o primeiro Verão que passa sem água, e apela. “Espero que vejam com mais atenção a gente, pois esse lado sempre fica sem água neste período de verão. Infelizmente, sempre foi assim. É muito difícil passar por esse transtorno, está sendo um caos”.

Nota de esclarecimento

Durante esses meses, o Voz das Comunidades entrou em contato com as autoridades cobrando uma solução para a falta d’água no Complexo do Alemão. Novamente falamos com a Cedae sobre a situação que permanece em diversas localidades, mesmo com conserto da elevatória. 

Em resposta, a companhia informou que o abastecimento foi normalizado nas localidades da Alvorada, Central e Grota após reparo em bomba realizado dia 30 de dezembro. A Cedae afirma que possui contato direto com a associação de moradores que solicita atuação na comunidade e até o momento não foi passado relato de desabastecimento das demais localidades. De toda forma, equipes da Cedae irão vistoriar as outras regiões a fim de verificar a situação do abastecimento.

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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