Há um ano, os moradores do Jacarezinho, na Zona Norte do Rio de Janeiro, vivenciaram a negligência e violência do Estado nas mãos dos 200 agentes que participaram da chacina policial mais letal da história do Rio de Janeiro, que deixou 28 mortos na comunidade.
Após 365 dias desta ação violenta, 10 das 13 investigações do Ministério Público foram arquivadas, 1 segue em andamento, segundo informações do G1. Por outro lado, duas denúncias foram aceitas pela Justiça. Os inquéritos arquivados são relacionados a 24 das mortes.
Para o advogado e coordenador do Instituto de Defesa da População Negra, Joel Luiz Costa, de 33 anos, a situação demonstra que as vidas e corpos negros não são dignos de um retorno da Justiça Brasileira verdadeiramente. Cria do Jacarezinho, ele desempenha a defesa das famílias atingidas pela chacina dos agentes de segurança pública.
Teste 3
“Você vê que não há qualquer movimentação do Estado do Rio de Janeiro nesse sentido de conclusão do inquérito de fato como ocorreu. Nem me parece que terá, dado que o governador Cláudio Castro entende que a operação foi um sucesso”, comenta.
O comentário do advogado vai de encontro com o posicionamento de Cláudio Castro após 24h da chacina no Jacarezinho, antes mesmo da divulgação dos nomes e ocupações das vítimas. Nele, o governador defendeu a operação afirmando que houve todo um planejamento para a realização dela e ressaltou que prosseguiria com as investigações sobre as mortes. Entretanto, as famílias e a comunidade seguem sem respostas efetivas.
Ainda segundo Joel, a demora reforça um padrão de atuação do Estado brasileiro e também um racismo inconstitucional. A equipe de reportagem do Voz das Comunidades entrou em contato com a assessoria de comunicação do Governo do Rio de Janeiro, mas não obteve retorno ainda.
No dia 21 de abril, o Governo do Rio de Janeiro enviou um documento para o Supremo Tribunal Federal (STF) afirmando a adoção de planos de redução da letalidade policial no estado. Entretanto, quatro dias depois dessa afirmação ao judiciário, Jhonathan Ribeiro, de 18 anos, morreu baleado por um Policial Militar no Jacarezinho. Em depoimento na corregedoria, o agente policial confessou que não houve troca de disparos e alvejou o jovem por “sentir-se ameaçado” pela suposta presença de uma arma de fogo na cintura.
De acordo com o defensor público Guilherme Pimentel, essas ações são respaldadas através de um discurso de legitimação da letalidade dos agentes ao invés da redução da violência. À frente da instituição que atende as famílias vítimas da maior chacina do Rio de Janeiro, ele vê essa normalidade como um grande problema.
- Após decisão do STF, Governo do Rio anuncia medidas de redução de letalidade em operações policiais
“A gente vê muitas vezes o discurso político ser de legitimação da letalidade e não na busca de redução da letalidade. E esse é um problema grande, pois se quem tem o controle das polícias não busca essa diminuição da violência. Pelo contrário, busca legitimar, mostra que nosso horizonte é muito ruim. Claro, há uma ressalva com a publicação deste decreto de redução de letalidade policial publicado, que não partiu do Poder Público, mas sim do judiciário. Porém, esse tal plano não foi construído coletivamente, ouvindo os moradores de favelas e de quem convive com essa realidade diariamente”, detalha.
Para ele, a raíz do problema também aprofunda o racismo e o preconceito com a favela. A demora para a conclusão de um inquérito tão essencial para promover à justiça demonstra que certas ilegalidades e brutalidades são bem-vistas dependendo da região que forem realizadas.
“A chacina do Jacarezinho revela muito do racismo e do preconceito com a favela. Pois, para o começo de conversa, uma operação daquela não aconteceria em outro lugar, apenas nas favelas. Em lugares que são preenchidos por pessoas negras. Os direitos humanos não são garantidos nessas localidades, como em outras. Quer ver algo mais evidente? A gente já viu a escola e centros de saúde pararem de funcionar por diversos motivos, falta de materiais e insumos, por exemplo, mas não se tem notícia da falta de ações ou operações policiais pela falta de munição ou de gasolina para as viaturas”, finaliza.