Cabelo na régua e muita resenha. Esse é o estilo de vida que conduz a vida da organização e dos participantes da Batalha dos Barbeiros Brasil, que já está no seu oitavo ano de existência. Criada pelo casal Hugo Abreu, o “Paizão”, e Erica Nunes, conhecida como “Madrinha”, a competição de cortes de cabelo tem ganhado cada vez mais destaque nas favelas e já chegou a rodar outros cinco estados do Brasil. Hugo conta que a inspiração surgiu a partir das competições de passinho.
“Começou em Campo Grande, porque sempre tivemos uma relação muito próxima com o passinho. Sempre víamos o pessoal comentando que o corte era melhor que o do outro, então resolvemos criar a competição de barbeiros. Hoje nós já vemos produtos para barbearia dentro de feiras de beleza, o mercado cresceu muito. É lindo ver isso“, relata o Paizão.
O formato de competição é dividido em duas modalidades: corte e desenho. Durante o ano acontecem etapas abertas em algumas comunidades e, no fim do ano, a grande final com todos os campeões – em 2020 será no dia 8 de novembro, no Parque de Madureira. No evento da final de 2019, foram mais de 7 mil pessoas presentes. Os ganhadores recebem premiações e troféus.
Batalha dos Barbeiros muda vidas
Teste 3
A rotina de organizar e ajudar os competidores fez com que Hugo também aprendesse a cortar cabelo. Além disso, a Batalha dos Barbeiros Brasil se tornou muito mais que uma competição. Cursos profissionalizantes e workshops acontecem com frequência e dá a oportunidade de muitos mudarem de vida.
“Temos três unidades para dar o curso, em Campo Grande, Méier e Barra da Tijuca. São oito meses de duração, 15 alunos, sendo que três são bolsistas. O nosso curso ensina a ser empreendedor também, não é só o corte de cabelo. Montar um espaço de empreendimento para não só sobreviver, mas viver daquilo. A gente tem barbeiro que era vida do crime, tinha foto de fuzil e hoje ele é conhecido no Brasil inteiro por dar aula. Isso é muito gratificante. Uma pessoa que sai da prisão, do abrigo e a gente traz e ajuda“, conta Hugo.
Um dos jurados da edição deste domingo (18), DG Barber reforça a questão social da Batalha e dos cursos e afirma que não é só o corte que ele avalia durante a competição.
“Avaliação é do começo ao final do corte, o barbeiro por completo. O movimento com máquina, a postura, o manuseio dos equipamentos. A gente lida com o sonho das pessoas. O Rio de Janeiro está crescendo cada vez mais na modalidade. A gente vê a garotada sonhando em ser barbeiro, virou uma profissão que a pessoa se orgulha. É muito gratificante ver que a gente pode resgatar pessoas que não tinham uma profissão. É um trabalho social”, afirma DG, dono de uma barbearia em Pedra de Guaratiba.
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Nervosismo e visibilidade
Os competidores da Batalha visam conquistar o grande cinturão final. Entretanto, para muitos que estão competindo pela primeira vez, a emoção existe desde a primeira etapa. Luiz Felipe, de 28 anos, é barbeiro desde os 14 e saiu de Magé para fazer a primeira participação na Batalha dos Barbeiros Brasil, na Cidade de Deus. O trabalho de cortar foi ensinado pelo seu irmão, também barbeiro, que foi assassinado perto do local em que mantinham a barbearia em conjunto.
“O que me motivou a vir foi o sonho. Depois que mataram o meu irmão, eu foquei em mostrar o trabalho dele. Uso isso como inspiração, porque se não fosse ele, eu não seria nada. Eu gosto de mostrar a arte, mostrar o que aprendi. Peguei o exemplo dele e ensinei meus primos e outras pessoas a cortarem para não irem para o caminho errado. Foi cansativo estar aqui, não sabia onde era, primeira vez em competição. Mas o sentimento é de sonho realizado. É uma porta de visibilidade“, declara Luiz, que se arriscou na categoria de desenho no cabelo por também ser tatuador.
Para o barbeiro baiano Leandro Moreira, de 35 anos, morador no Rio de Janeiro há 12, a trajetória com a máquina nas mãos vem desde os 21. Apesar de já ter participado de outras duas competições, a etapa da Cidade de Deus também foi a primeira vez na Batalha dos Barbeiros Brasil.
“É a mesma adrenalina da primeira competição. A partir do momento que você perde o frio na barriga, acredito que é hora de parar. O maior desafio é o meu nervosismo. A minha disputa é comigo mesmo, porque eu tenho certeza que amanhã eu posso fazer melhor do que hoje. Procuro sempre focar nisso. O prêmio é bom, mas vejo esse momento como visibilidade, outras pessoas verem o meu trabalho. Essa ideia da batalha é muito importante para a comunidade abraçar e incentivar os jovens. Independente da competição, isso é um projeto que muda vidas. Nós ganhamos com a experiência de estar participando“, conclui Leandro, que é gerente de uma barbearia na Tijuca.