Muitas pessoas ainda tem dúvidas sobre o nome social, o que é? Quando deve ser usado? Para tirar essas dúvidas procurei o Michel Lucio, advogado, bacharel em administração, com formação em Sociologia e Ciência Política pela Universidad de Buenos Aires na Argentina. Atualmente presidente e fundador do Complexo LGBT, um grupo LGBT do complexo do Alemão e adjacências.
Michel Lucio – presidente e fundador do Complexo LGBT, um grupo LGBT do complexo do Alemão e adjacências.
A ideia dessa entrevista é esclarecer a questão do nome social, quem pode fazer uso dele?
Bem, toda pessoa natural tem personalidade, que pode ser adquirida de acordo com as seguintes teorias: Teoria concepcionista: o indivíduo é dotado de personalidade desde o momento de fecundação do óvulo pelo espermatozoide; e a Teoria natalista: o indivíduo é dotado de personalidade a partir de seu nascimento com vida. O nome social pode ser definido como um nome civil que não aderiu à personalidade da pessoa natural, portanto é o prenome que é utilizado publicamente distinto do nome civil de quem o utiliza. É permitido aos transexuais e, em alguns casos, na vida escolar, quando por exemplo um aluno não quer ser chamado por seu nome civil. Veja que o nome social é diferente de apelido, pois se assim fosse em praticamente todos os atos da vida seria permitido a todos ser chamado por seu apelido, sendo a distinção máxima a falta de aderência do nome civil à personalidade da pessoa natural – exemplo mais aceito: o transexual em que o fato de ser chamado por seu nome civil causa constrangimento e exposição notoriamente constante ao ridículo, dado que o nome civil não representa a pessoa natural.
Teste 3
A utilização do nome social é prevista em lei?
Então Monique, a utilização do nome social não está prevista em lei, mas em Decreto. O Decreto nº 8.727, de 28 de abril de 2016 sancionado pela Presidenta da República Dilma Rousseff. E para que as pessoas entendam, a lei obriga a fazer ou deixar de fazer, e o decreto, não. O Decreto é o princípio genérico da legalidade, previsto expressamente no artigo 5.º, inciso II, da Constituição Federal. O Decreto serve para regulamentar a lei, ou seja, criar meios necessários para fiel execução da lei, sem contrariar qualquer das disposições dela ou inovar o direito. Por exemplo, digamos que já exista uma lei que OBRIGA as pessoas a terem registros civil ou seja um nome. Porém, nessa lei não está permitido o nome social, então cria se um decreto para que seja permitido o uso do nome que identifique a pessoa, então o nome social passa a ser permitido por meio de decreto mesmo que não esteja previsto na lei que obriga o registro civil. Ou seja, o decreto permite em seu art°1 que transexuais e travestis façam uso do nome social sem alterar ou contrariar a Lei de Registro Civil.
Caso alguém não respeite o meu desejo em ser chamado pelo nome social, existe algo que eu possa fazer?
Olha Monique, quanto a ser chamado pelo nome social acredito eu que basta uma boa apresentação cordial entres as pessoas para que esse desejo seja atendido, ou seja, se você que ser chamado como Maria apresente-se como Maria e pronto! Agora quanto se trata de pessoas jurídicas como empresas, ou instituições, administração pública, autarquia e funcional aí é diferente. Porque o direito de uso do nome social deve ser atendido pois é permitido por decreto e permite em seu Art°2 que as instituições atendam a esse direito. E vale ressaltar que, o parágrafo único do Art°2 proíbe o uso de expressões pejorativas e discriminatórias para referir-se a travestis ou transexuais. E lembro ainda que essas expressões podem ser capituladas como crime de injúria racial o que é bem diferente do crime de racismo. O Crime de injúria racial está previsto no art°140, parágrafo 3º do Código Penal enquanto o crime de racismo está previsto pela Lei 7.716/1989 e ambos possuem disposições bem diferentes. Entretanto, na minha opinião como jurista penso que a lei deveria ser mais especifica quanto a discriminação por gênero, inclusive já existe um projeto de lei no senado que foi apresentado pela Senadora Gleisi Hoffmann que pretende penalizar a injúria praticada em razões de gênero. Porém, enquanto esse projeto não for aprovado, tramitado e entrar em vigor os casos de injúria em razão de gênero aos LGBT’s vão ser capitulado pelo o art°140ª do Código Penal como injúria racial.
Soube do seu Projeto chamado Complexo LGBT, pode contar um pouco sobre ele?
Bem, na época eu trabalhava na SEAP Secretaria de Estado de Administração Penitenciária e na Vara de Execução Penal no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, o que não tem nada a ver com a temática LGBT meu assunto era criminal, execução penal e administração em presídios do estado. Porém a SEAP fica no mesmo prédio da SEASDH, sendo que uma fica no 3° andar e a outra fica no 6°. E na SEASDH eu tinha um amigo de longa data que trabalhava junto ao projeto Rio Sem Homofobia e sempre quando nos encontrávamos falávamos e brincávamos quanto ao fato de trabalharmos um perto do outro e quase nunca nos vermos, afinal de contas as atividades de cada um eram bastante extensas e estafantes. Até aí eu não tinha ligação nenhuma com nenhum projeto LGBT, não me preocupava como esse assunto afinal contas eu trabalhava com crime e era uma rotina bastante intensa. Mas foi em 2013 que surgiu uma ideia de criar uma organização que fosse exclusiva para atender juridicamente aos direitos LGBT’s, uma organização que servisse de amparo para casos como o da transexual que foi agredida dentro de uma delegacia em 2015. Então eu criei o Centro de Defesa LGBT que nada mais era que uma rede de advogados amigos que prestavam orientações e esclarecimentos gratuitos a assuntos da temática LGBT. Essa rede se consistia em 4 advogados parceiros que prestavam esses serviços em seus respectivos estados, eu no Rio de Janeiro, outro em São Paulo e Curitiba e um em Brasília. Eu era o presidente da organização a qual essa rede pertencia. A zona territorial dessa rede no Rio de Janeiro tinha como sede o bairro de Ramos, que é um dos bairros que o complexo do Alemão alcança. Acontece que não foi mais possível manter essa rede pois ela utilizava recursos próprios e com o fim desse projeto, ficou somente eu no Rio de Janeiro desenvolvendo essas atividades. E eu comecei a notar que o Complexo do Alemão possui uma grande demanda e necessidades de políticas sociais que atendam aos direitos LGBT’s. Então eu passei a atender essas demandas e objetivando uma maior identificação com a comunidade, o nome da organização passou a ser COMPLEXO LGBT. E hoje nós desenvolvemos entorno do complexo do alemão diversas atividades voltadas ao público LGBT.
Quem pode participar do COMPLEXO LGBT?
Todos podem participar, podem inclusive se inscrever para ser um mobilizador voluntário da organização e não precisa ser só as pessoas que moram no complexo do alemão, como eu disse, todos podem participar.
Onde as pessoas podem te procurar?
Bem, em parceria com uma ONG do Complexo do Alemão que tem como presidente e fundadora a Assistente Social Lucia Cabral que cedeu gentilmente um espaço para que o Complexo LGBT pudesse atuar, hoje o Complexo LGBT tem como sede o EDUCAP que fica localizado na Rua Canitar- Campo do Sargento. Mas podem nos contatar também pelo nosso e-mail [email protected] e temos também nossa página no Facebook, Complexo LGBT é só procurar lá, curtir e pronto já estará bem próximo de nós.
Essa entrevista foi bastante esclarecedora para mim e espero que tenha ajudado outras pessoas a compreender melhor a questão sobre o Nome Social. Agradeço ao Michel Lucio pelas contribuições.